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20080207

FECHA-SE o coração...


Regressar à água que se dissolve na água.

Sobrevoar os salgueiros ardentes, com um nó de sal na

garganta.

Deitarmo-nos no lume da alba e acreditar que da lama cresce a cabeça feminina de um deus.

Regressar ao cheiro acre das salivas e da insónia. E à languidez sombria dos sonhos - à boca inquieta dos mortos que aprenderam a respirar a febril poeira dos astros.

Regressar com a alegria e a tristeza no ouro fundo dos teus olhos, dizias.


Mas o corpo esquecera as horas dos desencontros.
As palavras eram agora exactas, cintilantes. Esculpidas no fulgor do que não era possível adiar...porque o movimento é a arte da mudança.


E regressámos, lentamente, com a certeza de que não voltaríamos a tocar na linguagem abandonada.

[...]


Al Berto
in Dispersos

20071219

e...


perseguem-te os cães de ninguém e

por trás da tua cabeça rebenta a luz

que lhes devora a reles pelagem - com um dardo

abre a ferida do ouro que carregas à cintura


Tudo se mantém obscuro na orla das dunas

as mulheres crescem por dentro das miragens

mostram os seios

descem às fontes turvas dos oásis

dormem

envoltas na poeira e na baba dos dromedários


durante a noite um chacal ronda o limite

das imagens -uiva por dentro da pele

deixando pegadas na chamejante madrugada


levanta os olhos e a voz - abre a boca

solta a praga de gafanhotos acidulados pela geada

dos verdes dos azuis das antracites e sorri

ao fechares o pequeno livro da abíssinia



quem anunciará aos vindouros destas paragens

o esplendor do lume por cima da foresta de bisédimo?


Al Berto
in Horto do Incêndio
Fotos Sapo(C) Manuela Pestana

20071210

Cartas de Outono...


Enquanto dormes constrói-me um rosto de luz, no limbo do teu sonho. Toca-o e acorda-me.

Caminha comigo, peço-te, na inquietação daquele rosto, e nesta alegria suspensa na solidão.


[...]


Al Berto,
Dispersos
Imagem (C) Tamara Lempicka

20070826

POR ESTE DIA DEFINITIVO...


Nas gretas das Pedras descansam as salamandras

fascinadas pela cintilação das estrelas aquáticas


a paisagem decompõe-se em estalidos líquidos

impressões digitais dedos finos mergulhados no lodo

bostas de vaca peles intumescidas de frutos caídos

juncos cobertos de larvas onde a luz incide

rumores que as imagens deixam escapar como saudades


se colar os pedaços da fotografia

surpreenderei a noite gorgolejando tépida por entre os eucaliptos

o regresso a casa em 18x24 à hora dos rebanhos beberem

vigiados pelos vagarosos


Al Berto,
Vigílias
Imagem (C) J. Hogan